terça-feira, março 20, 2007

O império contra ataca ---A viagem de Bush pela América Latina

Yo no te digo tío, Don Samuel ----- Porque hermano de mi patria usted no es


E, então, os olhos do governo estadunidense se voltaram para a América Latina. Depois de anos matando iraquianos civis, sob o argumento de que são malvados terroristas, e ainda disseminando pela mídia prostituída outras tantas mentiras acerca do Irã, George W. Bush decidiu dar um passeio pelo quintal de casa, visto que, para ele, algumas ervas daninhas estão crescendo para além da conta e é preciso passar a ceifadeira.

O jornal New York Times mostrou, em detalhes, à nação do norte que a Venezuela anda gastando muito dinheiro com materiais militares e, segundo os analistas, isso se configura um abuso. É claro que o mesmo jornal não dá uma linha sobre o material bélico produzido anualmente pelos Estados Unidos. Bom, isso não é novidade. Para os estadunidenses, o país ter o maior arsenal de armas do mundo, inclusive atômicas, é muito natural. São a polícia do mundo. Eles podem ter bombas atômicas. O Irã ou qualquer outro país, não.

Pois é para tentar cortar as "asinhas" do presidente venezuelano (a erva daninha em questão) que Bush faz um rápido ecorrido pelo sul do continente. A ascendência "maléfica" de Chávez sobre Evo Morales, na Bolívia, e Rafael Correa, no Equador, está fugindo ao controle, pensam os conselheiros do governo estadunidense. Além disso, pelas beiradas, Chávez vem fazendo acordos com países que, apesar de não guinarem muito para a esquerda, estão buscando novas parcerias, livres das garras da águia, como a Argentina, por exemplo, com quem firmou contratos bilaterais bastante significativos, além do compromisso de também apoiar a idéia de uma nação única, latino-americana, configurando um grande bloco de poder.

Outros países do Caribe e da América Central têm fechado acordos envolvendo trocas comerciais dentro dos moldes da ALBA, a Alternativa Bolivariana para as Américas, que propõe um novo modelo de contratos, sempre levando em consideração a realidade social, econômica e cultural dos povos, sem imposições vantajosas apenas para quem tem maior poder de barganha. O oposto da ALCA, sonhada pelo governo dos Bush, desde o pai.

A viagem do presidente estadunidense é paradigmática. Funcional tal como no passado funcionavam os passeios dos Césares. O império se fazendo ver, o grande olho a observar e a dizer: estamos aqui. Bush visita a Colômbia, com quem mantém estreita relação. Como um bom vassalo, Uribe segue cumprindo as ordens do senhor imperial, reprimindo os movimentos de libertação, fortalecendo o Plano Colômbia - de ocupação massiva por parte dos soldados estadunidenses - desalojando famílias, removendo o terror entre os lutadores sociais. É um parceiro estratégico porque está na fronteira da Venezuela e do Equador, dois dos países considerados "perigosos", subsumidos na "onda vermelha". Passa também pelo Uruguai onde Tabaré Vasquez se configura uma promessa. Já firmou acordo de livre comércio e pode ser um bom aliado na parte sul. Pode ser convencido a não sucumbir aos encantos chavistas e, de quebra, ajudar o parceiro brasileiro nesta empreitada.

Bush ainda vai dar um pulinho na Guatemala, país amigo e uma força a barrar os avanços de Chávez na América Central. Visita também o México, de Felipe Calderón, presidente eleito a partir de eleições fraudulentas, como denunciam os movimentos sociais daquele país. Talvez por isso tenham muito que conversar. Experiências semelhantes. Além disso, o México é a parte mais próxima do quintal. Precisa, mais do que qualquer zona, manter-se limpo das ervas socialistas.

E, o que nos interessa particularmente, Bush visita o Brasil. Vai conversar com o "companheiro" Lula, com quem conta para ajudar a frear o "Efeito C". Na imprensa brasileira já pipocam as análises acerca dos "grandes benefícios" que o imperador traz na bagagem. Uma delas é a possibilidade de um acordo para negócios envolvendo o álcool. Os usineiros já se preparam para, finalmente, entrar no mercado do norte, até então fechado, visto que os EUA fabricam seu próprio álcool. É a "energia do futuro" o grande "produto" no qual a águia está de olho, uma vez que sabe ser o petróleo um bem em extinção, além de causador dos males que o planeta vem vivendo, entre eles o aquecimento global.

Então, os arautos do imperador já se apressam em falar dos "fabulosos" negócios que os empresários da cana poderão fazer, pelo menos em médio prazo, caso os EUA abram mesmo seu mercado. Para os trabalhadores também há vantagens incríveis no horizonte, visto que o número de cortadores de cana deverá aumentar extraordinariamente. A mídia cortesã já saúda o fato de voltarmos aos tempos da casa grande e senzala. O Brasil como um imenso canavial, produzindo a energia limpa que o planeta tanto necessita.

Mas, no meio desta euforia colonizada, as vozes dissonantes já começam a soar. Alguns analistas questionam a idéia de usar produtos comestíveis como combustível. Cana ou óleo de plantas saem da lógica alimentar e passam a ser produtos geradores de energia para sustentar o capital. Há quem diga ser um paradoxo a expressão "desenvolvimento sustentável". Paradoxo e impostura. Não existe. Não nesse modelo capitalista predador. “Haveria que se pensar o que o Samir Amin chama de desconexão”. Um outro modelo de vida, despegado da lógica capitalista. Mas é coisa para muito debate.

De qualquer forma, essa conversa de abrir mercado para o Brasil nos EUA certamente é só um truque no qual apenas uma imprensa cortesã, colonizada e autista pode cair. O que está em questão mesmo é a paralisação da influência de Chávez nos "países amigos". Manter os gerentes dos quintais de rédea curta, bem ao estilo texano, é o objetivo central. Mostrar quem manda, prometer uma migalha aqui e outra ali, inflamar as vaidades, provocar a cizânia e, quem sabe, até acertar algum trato de "combate ao terrorismo", visto que este tipo de coisa já está aparecendo por aqui também, como alardeiam imprensa e governantes.

A grande ameaça comunista que foi o mote para uma série de retrocessos e ferozes ditaduras militares financiadas pelos EUA nos anos 50 e 60 do século passado, agora tem outro nome. É Chávez. Um presidente que tem petróleo e uma proposta de mudança muito concreta, desconectada do império. Não é nem o socialismo, mas já incomoda um bocado. Resta saber qual vai ser a atitude de Lula. Alguém arrisca um palpite?

Entre os movimentos sociais tudo já está claro. E os protestos devem acontecer em todo o país. Não só pelas questões singulares que envolvem o Brasil, mas, solidariamente, em nome de todos os que sofrem os efeitos de um sistema imperial opressor, destrutivo, manipulador e irracional.

O OLA é um projeto de observação e análise das lutas populares na América
Latina. www.ola.cse.ufsc.br

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