segunda-feira, julho 09, 2007

Quase nada? Pe. Carlos F. da Silva

Não aprecio polêmicas estéreis. Jamais tive disposição de impor, a qualquer custo, qualquer verdade, por mais cristalina que fosse. No campo da moral, então, sempre tive um cuidado escrupuloso para tratar de temas delicados, bem como aqueles necessários e urgentes como o aborto. Mas não há como não reagir pronta e apaixonadamente a uma declaração de modelo Gisele Bundchen na qual afirma que, com quatro meses de vida, o bebê é quase nada. Dá uma indignação tão grande que a vontade é de possuir o mesmo espaço que ela tem na mídia para gritar que ela está terrivelmente equivocada. O erro da moça é tão grandioso que supera fronteiras até mesmo da militância abortista. Chega a ser expressão de uma estrondosa burrice. Acostumada como é de ser bajulada em toda parte, certamente ela não teve tempo sequer para ser minimamente informada sobre o assunto. Sua ignorância é colossal.
Todo mundo sabe, menos ela, que na décima sexta semana os principais órgãos do feto já estão completamente formados. O bebê está bem crescido, com cerca de quinze centímetros e já chegou numa fase de maturidade razoável. Para as mulheres que, carinhosamente, aguardam o nascimento do filho, justamente no final do quarto mês é que podem ver a imagem inteira do bebê. Nesse período, com os avanços tecnológicos médicos de hoje, por meio de uma ultra-sonografia já se pode diagnosticar, por exemplo, se a gestação é de gêmeos ou se existem anormalidades genéticas. Com quatro meses, os pais amorosos que desejam o nascimento da criança, podem até saber também qual o sexo do bebê e onde a placenta está alojada. É nessa hora que se constata também as batidas do coração do feto. Essas informações básicas e seguras podem ser obtidas no mais simples material sobre gravidez. Lá onde a Gisele mora, os Estados Unidos da América, essas informações devem ser acessíveis em qualquer panfleto de farmácia. Mas ela deve se ocupar de coisas mais importantes e se sente completamente à vontade para opinar sobre o assunto, quando está em terras consideradas desinformadas, pelo que se pode deduzir de sua folga em tratar do tema.
Qualquer consideração sobre o embrião dentro ou fora do caldeirão de discussões sobre o aborto precisaria responder ao conhecimento básico de seu crescimento. Se não houver, ao menos, informação suficiente a respeito da mecânica, como se poderá tratar de ética, de amor, de defesa da vida? E o que me parece mais curiosamente perverso nesse assunto absurdo, nessa situação, é justamente o fato da declaração partir de uma mulher, pois isso significa que ela nem se deu conta de como se dá uma fase importante de atividade de seu aparelho reprodutor. Faltando-lhe uma consciência do ser mulher, não se pode entender como é que lhe parece cômodo fazer afirmações dessa natureza.
Costuma-se dizer que existem três espécies de ignorância: o nada saber, o saber mal o que se sabe e o saber coisa diversa da que se deveria saber. A beldade loura mais bem paga do planeta para exibir-se enquanto mostra roupas (ou falta delas) pelo mundo afora navega entre as três categorias com a mesma desenvoltura de que desliza numa passarela. Impossível não registrar uma máxima do alemão Goethe: “não há nada mais terrível do que uma ignorância ativa”. É mais avalassaladora. Especialmente se demonstrada por uma pessoa que tem todos os canais da comunicação de massa aos seus pés em qualquer parte do mundo já mortalmente contaminado pela mentalidade do consumo. Nem dá para levar em conta a intenção embutida no comentário estúpido. O aborto é uma questão tão séria que não pode ser trazida à tona pelo murmúrio todo de alguém que nem se deu ao trabalho de freqüentar bem a escola. O aborto é uma questão humana, antes de ser moral. É uma questão de saúde, antes se ser objeto de análise das religiões. O aborto só pode ser foco de um debate aceitável se os seus defensores ou combatentes possuírem o mínimo de informação técnica. Uma mulher que denuncia ter cabulado a aula de Puericultura não está apta para participar da conversa em público. Talvez tenha sido o tilintar dos níqueis que, lamentavelmente, arrancou essa menina do caminho da formação geral e a jogou no circo das bobagens. Que pena!

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